Lembro-me dos
meus tempos de universitária; conheci num café explorado na altura por uma
família cabo-verdiana, um jornalista, que escrevia peças para a Rádio
Alfa, na altura a rádio lusa dos arredores de Paris. Esse senhor
falou-nos uma vez, a mim e aos meus colegas, deste povo português e da
sua especificidade, se calhar ainda herdada dos tempos dos navegadores
portugueses que exploravam o mundo, com os seus muitos sucessos e o orgulho que
originavam, da Saudade. Este termo, dizia ele intraduzível, representa muito
mais do que uma simples nostalgia, representa algo, que só pode ser manifestado,
cantando, pelo nosso Fado.
Hoje, lembro-me
desta Saudade, desta Nostalgia e penso. Muitos amigos, como eu, optaram por
emigrar e assim se espalharam pela Europa, relembrando a onda de emigracao dos
anos 60 para fugir a pobreza e a dictadura; outros para Macau ou o Brasil,
regressando a terras em tempos conquistadas pelos nossos antepassados. O povo
português continua hoje ainda um povo de migracao e lá carrega com ele toda a
Saudade que o caracteriza. Hoje muito facilmente nos apercebermos de pequenos
sinais desta Nostalgia pela via dos novos meios de comunicacao e das redes sociais.
Diz que a bandeira Portuguesa foi a que mais vezes foi publicada no facebook na
altura do Europeu de futebol no passado mês de junho de 2012, o emigrante apoia a
selecção, apoia Portugal; para mim, clara manifestação da Nostalgia que
sentimos.
Isto tudo
levou-me a pensar, de que temos saudades? Falo por mim quando digo que tenho
Saudades dos momentos passados com as minhas amigas, as festas, os sorrisos, as
alegrias. Tenho saudades das sextas-feiras de verão, na esplanada do café Kazino
do Pedrogao, a beber umas minis na companhia de amigos contemplado o pôr de
sol no mar da nossa praia. Acredito que, na vida, o que mais nos realiza são estes
pequenos momentos que nos enriquecem a alma, e as pessoas que nos aquecem o coração. Saudades
dos Amigos.
Mas acredito também, que
estas Saudades têm de ser preservadas e guardadas num cantinho da
nossa memória, num cantinho do nosso coração, porque é lá o lugar delas. Temos
saudades do que nos lembramos, e não podemos esquecer que nada é imutável,
que com o tempo, as coisas de que nos lembramos mudaram, tal como nós também mudámos. A
cada dia que passa, impregnamo-nos do que nos rodeias, novas pessoas,
novas experiências, novos sentimentos, e acredito que o mesmo acontece
com tudo. A única coisa que não muda, é o
momento que nos lembramos e as pessoas inseridas nesse preciso momento e os
sentimentos experienciados naquela exacta circunstância.
Assim, quando
regressamos a lugares do passado, eles também mudaram. Pensei nisso
porque um amigo meu, também emigrado, publicou no seu perfil uma foto duma
discoteca exprimindo a saudade dele em relação aquele sítio
fantástico, e lembrei-me, aquele sitio foi fantástico, mas só
continua a ser fantástico nas memórias que temos dele,
hoje, já só é um monte de cimento com cores diluidas pelo tempo, com brilho terno. E
pensei. A Saudade que sentimos tem a ver com aqueles específicos momentos
importantes para o nosso coração, e é onde pertencem, num
cantinho das nossas memórias.
Penso que, quando
tentamos reviver memórias passadas, só nos podemos sentir
tristes porque o momento nunca poderá ser o mesmo, o sítio é diferente,
as pessoas são diferentes e nos próprios também já não
somos os mesmos. Acredito que a tristeza é dupla: há a desilusão que
surge quando a tentativa de recriação do momento não é bem sucedida, e a
tristeza por procurarmos alegrias onde elas já existiram em detrimento
de onde elas ainda podem vir a existir. Temo que, na tentativa de recriar
momentos, deixemos escapar outros, outros momentos, outras alegrias, outras
recordações. Acho que é um risco que não quero correr. Quero
acarinhar tudo o que fez de mim a pessoa que sou hoje, mas quero continuar a
evoluir e não parar no tempo, não tentar regressar a momentos que já não são, nem
nunca mais serão.
Quando o
jornalista falava na Saudade portuguesa ser intraduzível por ser muito mais que
uma nostalgia, ele disse, que era porque esta nostalgia trazia fiosinhos de
tristeza; na altura pensei ter percebido o que ele queria dizer, hoje acredito
que sei o que ele quis dizer, porque este sentimento, esta nuance também já faz
parte de mim, algo que com os meus vinte anitos não podia entender.
Hoje, tenho
Saudades de momentos que para todo o sempre acarinharei. E hoje quero criar e
criar e criar mais Saudades.
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